quarta-feira, 18 de março de 2009

Quem te viu, quem te vê

Semana de 02 a 08 de março de 2009


Não estamos nos referindo à famosa letra de música de Chico Buarque, mas, sim, a uma das últimas afirmações do presidente do Banco Central (Bacen), Henrique Meireles. Após passar meses apregoando os “sólidos fundamentos da economia brasileira”, agora alerta a todos que a crise afetará todos os países emergentes, incluindo o Brasil. Meireles afirmou, durante a reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, no último sete de março: “Não temos dúvida de que a segunda rodada da crise será nos países em desenvolvimento”. Jura! (dizem os brasileiros). Really! (dizem os ingleses e norte-americanos). Parece que o presidente do Bacen foi mesmo o último a saber.
Como vínhamos relatando em nossas análises, a falsa tese do descolamento dos países emergentes, das nações desenvolvidas, finalmente desabou. As autoridades do país, que teimavam em negar que a economia brasileira estava entrando em crise, desde setembro do ano passado, agora reconhecem que a marolinha virou tsunami.


Índice de produção Industrial(*)
* Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem.

Nos primeiros meses de 2009 verificou-se queda da produção industrial brasileira. No mês de janeiro, a produção caiu 17,2% em relação ao mesmo período do ano passado. O consumo de energia da indústria caiu 14,9%, em janeiro deste ano, em relação ao mesmo período de 2008, de acordo com os dados do Ministério de Minas e Energia.


Consumo de energia elétrica para a indústria - 2008(*)
* Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem.

Consulta realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostrou que 80% das empresas adotaram alguma ação em relação a seus trabalhadores em razão da crise internacional. Em 54% dessas empresas houve demissão de funcionários, 32% concederam férias coletivas; 27% adotaram banco de horas; e 9% reduziram a jornada de trabalho e salários.
Com relação às ações governamentais, para contornar os efeitos da crise, 63% dos empresários da indústria assinalaram que o foco seria a redução de tributos; outros 51% marcaram corte de juros e do spread bancário. Em terceiro lugar, ficou a necessidade de aumentar a oferta de financiamento para capital de giro (30%).
Com a restrição do crédito, as vendas de máquinas e implementos agrícolas no país despencaram
25%, no último bimestre, seguidas também pela retração de 27% na venda de colheitadeiras. Apenas os veículos agrícolas de pequeno porte conseguiram sustentar as vendas devido, principalmente, aos programas estaduais e federais (“Mais Alimento”) de crédito a pequenos produtores, que permitiram o prolongamento da dívida do produtor, por um período maior.
O Ministério do Trabalho e Emprego registrou um saldo de aproximadamente 750 mil postos detrabalho fechados nos últimos meses de dezembro e janeiro. Para o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Milton de Moura França, o país poderá enfrentar o período mais crítico das relações de trabalho no Brasil, desde os anos noventa, devido à avalanche de processos trabalhistas. Dados do TST informam que 223 mil processos foram julgados em 2008, e o número de novos processos abertos foi 13% maior do que em 2007.

O setor que continua de vento em popa é o bancário. O resultado de bancos internacionais, no país, vai na contramão dos resultados negativos globais. O HSBC, por exemplo, que, diante dos prejuízos, está encerando suas atividades nos EUA, registrou um crescimento de 9% no seu lucro líquido anual, o maior resultado desde o início de suas operações no Brasil, há 12 anos.

Para dar mais uma injeçãozinha de ânimo no setor, o Banco Central, do Meirelles, autorizou o acesso dos bancos ao dinheiro das reservas internacionais, para pagar suas dívidas. De acordo com a Gazeta Mercantil, ficaram autorizadas as operações de empréstimos, em moeda estrangeira, para o pagamento de obrigações das instituições financeiras. Antes, era preciso comprovar que o dinheiro emprestado era para socorrer as empresas brasileiras. Liberou geral!
Para justificar tal medida, o Bacen explicou que os bancos terão mais folga, e com isso, podem aumentar a oferta de crédito internamente. Entidades como a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Fiesp, lembrando do ditado “de boas intenções o inferno está cheio”, considera que a oferta de crédito não significa que o dinheiro vai chegar até as empresas, devido aos custos dos empréstimos. “O que pode ocorrer é que, novamente os bancos sejam os únicos beneficiados”, afirma Ricardo Martins, um dos diretores da Fiesp.
Uma sugestão para enfrentar a crise financeira foi feita pelo Instituto de Pesquisa EconômicaAplicada, Ipea: o corte na taxa básica de juros de 12,75%, ao ano, para 7%, ao ano, até outubro. Dessa maneira, conforme o Instituto, o governo reduziria as suas despesas com juros em R$ 30 milhões, e não causaria impacto na inflação. Tal idéia, porém, não estaria de acordo com os interesses do setor bancário, o principal beneficiado pela elevada taxa de juros do Brasil.
A iminência de uma recessão, entretanto, fez o Comitê de Política Econômica (Copom) reduzir ataxa básica de juros, a Selic, em 1,5 ponto porcentual. A taxa, que era de 12,75, passou a 11,25% ao ano. A decisão, tomada no dia 11 de março, foi considerada acertada, porém, ainda muito tímida pela esmagadora maioria das entidades trabalhistas e patronais. Para o Sindicato de Metalúrgicos de São Paulo a decisão foi irrisória. Para a CNI, foi frustrante. Conforme o presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e de Indústria de Base (Abdib), Paulo Godoy, havia espaço para um corte maior. “O temor de que isso pudesse afetar o comportamento da inflação não era verdadeiro”, completa Godoy.

Como era de se esperar, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), por seu lado, considerou a decisão correta e adequada para o atual momento.

Por todo o mundo as más notícias não param de surgir. A dependência das exportações faz comque as economias asiáticas enfrentem grandes desafios. No Japão, as exportações desabaram 45,7%, no início de 2008. Na China, fábricas têxteis e de vestuário foram fechadas. Existem relatos de patrões que fugiram, deixando os operários no abandono. Foi o caso do diretor da Jianglong Group, importante fábrica de tingimento da cidade de Shaoxing, que fugiu em novembro, deixando uma dívida de 200 milhões de dólares e quatro mil funcionários sem trabalho.
Nos Estados Unidos, um dos principais destinos dos produtos asiáticos, continuam a cair os níveis
de produção e de emprego, fortes indicadores de que a crise ainda não chegou ao fim. O PIB norte-americano, no último trimestre de 2008, teve uma contração de 6,2%, em relação aos trimestres anteriores. A queda foi reflexo da redução dos gastos dos consumidores, responsáveis por 70% da economia do país. O produto estadunidense, para todo o ano de 2008, expandiu apenas 1,1%, e não foi pior por causa das exportações e das restituições de tributos que ajudaram a contrabalançar a redução do nível de consumo.


Produção Industrial para países selecionados(*)
* Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem.


O setor automobilístico foi o mais abalado por esta queda. A venda de carros e caminhões caiu 39,4%, em 2008. As empresas mais afetadas foram a Ford, General Motors, Chrysler, Nissan, Toyota e Honda.
Diante do cenário pessimista do consumo, o Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, anunciou no início deste mês mais um plano de ajuda financeira. Trata-se de um plano de estímulo ao consumo de 200 bilhões de dólares. Será permitido que o Fed compre papéis ligados a cartas de crédito e de empréstimos para automóveis. A preocupação dos especialistas é saber se os pacotes de ajuda como este podem contribuir para o aumento da dívida pública norte-americana, que já bateu recordes no final do governo Bush.
É esperar para ver!


Texto escrito por:
Maria Carolina Costa Madeira: Jornalista, mestranda em Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
progeb@ccsa.ufpb.br

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