quarta-feira, 1 de maio de 2019

Patriótico ou idiótico?


Semana de 22 a 28 de abril de 2019

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

Não sei se já foi percebido pelo caro leitor, mas o presidente Jair Bolsonaro parece ter redefinido a palavra patriota. No seu significado original a palavra patriota remete à adoração e ao orgulho dos símbolos pátrios e ao amor ao seu povo. Contudo, observando alguns dos projetos apresentados pelo presidente, pode-se observar que as ações propostas não são condizentes com o discurso “patriótico”.
A Eletrobrás é uma empresa de capital aberto e uma sociedade de economia mista, ou seja, tem como acionistas agentes privados e o próprio Estado, que detém a maioria das ações com direito a voto. O papel dela é de coordenar as empresas do setor elétrico brasileiro. Dentre as empresas que fazem parte do sistema, estão a Chesf, a Eletronuclear, a Furnas e a Itaipu. No dia 27 de fevereiro de 2019, Salim Mattar, secretário especial de Desestatização e Desinvestimento do Ministério da Economia, estimava que a privatização da Eletrobrás traria R$ 12 bilhões para as receitas da União em 2019.
Pois bem, no dia 29 de abril de 2019 foi noticiado o lucro das oito maiores estatais brasileiras, em 2018. Só no ano de 2018, a Eletrobrás obteve um lucro líquido de R$ 13,35 bilhões. Retirando-se daí a receita extraordinária da venda de quatro empresas de distribuição de energia, no total de R$ 2,97 bilhões, resta um lucro líquido de R$ 10,38 bilhões. Mesmo se levarmos em conta o efeito da readequação contábil, causado pelo projeto de Angra 3, no balanço da Eletrobrás, num montante de R$ 7,2 bilhões, resta um lucro líquido de R$ 3,18 bilhões. Este resultado foi atingido mesmo com o PIB brasileiro crescendo a 1,1% em 2018.
Vamos admitir que, por hipótese, o lucro da empresa se mantenha no mesmo patamar nos próximos anos. Vamos admitir que a participação do Estado brasileiro (fora o BNDES e outros fundos governamentais) no capital acionário da empresa também se mantenha. Admitindo que a União se aproprie de metade dos dividendos distribuídos em oito anos, os dividendos da Eletrobrás destinados à União cobrirão o valor de sua privatização, totalizando quase R$ 13 bilhões.
Qual a diferença disto para a privatização? Quando o Estado brasileiro vender, em parte ou no todo, suas ações, o dinheiro arrecadado entra no caixa uma única vez. Quanto aos dividendos pagos à União ao longo do tempo, esses duram o tempo em que a empresa estiver lucrando (na verdade, mesmo com prejuízo em 2017 a empresa distribuiu dividendos). Assim, o Estado brasileiro quer se desfazer de algo que traz ao orçamento uma renda permanente em troca de um dinheiro que só entrará uma única vez nas contas públicas.
Como foi afirmado anteriormente, as oito maiores empresas do país apresentaram seus resultados de 2018. Juntas, Petrobrás, Eletrobrás, Correios, Banco do Brasil, BNDES, BNB – Banco do Nordeste, IRB Brasil Re e Caixa Econômica Federal tiveram um resultado anual de R$ 74,3 bilhões. Nenhuma delas apresentou prejuízo. Em 2010, ano em que o PIB cresceu 7,5%, o resultado anual dessas empresas (com exceção da IRB Brasil Re) foi de R$ 64,9 bilhões em termos nominais. Trazendo para os preços de 2018, esse valor real foi de R$ 102 bilhões. Em 2011, quando o PIB do Brasil cresceu 4%, o lucro dessas empresas foi de R$ 64,4 bilhões. Em preços de 2018, isso equivale a R$ 96,4 bilhões. É bem verdade que em 2015, juntas, elas presentaram um prejuízo total de R$ 23,5 bilhões. Mas, somando-se os anos de 2010 a 2018, o resultado geral das maiores estatais brasileiras é de um saldo positivo de R$ 321,4 bilhões. Parte desse dinheiro, naturalmente, entrou como receita no caixa da União.
A “questão” que se coloca, então, é: por que o patriótico presidente permite que o seu Ministro da Economia, Paulo Guedes, realize as privatizações desses símbolos brasileiros que geram receitas permanentes ao Estado? Os patriotas não deveriam defender os “interesses da nação”? Parece que o termo “patriota”, de fato, perdeu seu significado. Agora ele é sinônimo de desnacionalização (ou o leitor acha que as empresas brasileiras terão condições de comprar a maior parte das estatais?).
Ou talvez de dancinhas “idióticas” que gritam “ê, ê, ê. Fora Dilma, Fora Lula, Fora PT...”.

[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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