quinta-feira, 17 de junho de 2021

Mistério no Banco Central: Revelado

Semana de 07 a 13 de junho de 2021

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Em março de 2021 publicamos aqui nesta coluna uma análise de conjuntura intitulada “Mistério no Banco Central”. Você pode acessá-la clicando aqui. Na ocasião, apresentamos algumas das principais lições dos Manuais de Economia sobre como o Banco Central (BC) pode controlar a inflação através da taxa básica de juros. No Brasil, essa taxa é a Selic. Pois bem, é hora de falar de inflação de novo, mais precisamente, da reunião do órgão do BC que decide a taxa básica de juros brasileira. No exato momento em que escrevo este texto, acontece, também, a reunião do Copom. A previsão de quase todos é de que haverá um aumento de 0,75 pontos na Selic, fazendo ela sair dos atuais 3,5% para 4,25%. Os que discordam disso acham que a taxa sobe ainda mais...

Na análise de março, diante do cenário ainda turbulento, levantei a hipótese de que a subida dos juros decidida naquele mês era uma ação que buscava influenciar as expectativas do “mercado” sobre os preços. Pouco tinha a ver com os canais que afetam a demanda agregada: crédito, ativos ou juros. Também foi levantada a hipótese de que aquela elevação nos juros teria pouca contribuição na redução da taxa de câmbio, via entrada de investimento estrangeiro: os especuladores não olham apenas os juros ao colocar dinheiro em um país. O Brasil, como o mundo inteiro também sabe, apresenta uma instabilidade sistêmica: economia, política, saúde, meio ambiente...

De fato, hoje, a inflação é um dos grandes problemas econômicos e sociais do Brasil. Apesar do PIB ter crescido mais do que o esperado (1,2% no primeiro trimestre de 2021), não significa que aumentou a renda de todos os brasileiros. Pelo contrário. Graças à inflação, a renda real média efetivamente recebida por cada pessoa dos domicílios brasileiros, caiu 10% no mesmo período.

O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) fechou maio com um crescimento jamais visto em 25 anos: subiu 0,83% no mês, com destaque para Habitação (+1,78%), Artigos de residência (+1,25%) e Transportes (+1,15%). Parece pouco, mas no acumulado de doze meses, a inflação está em 8,06%. Um dos elementos que está causando isto é a elevação do preço das commodities que o Brasil exporta, pois o movimento dos preços no mercado mundial puxa os preços internos na mesma direção. O índice de cotação das commodities brasileiras, calculado pelo BC, mostra que houve um aumento de 48,9% nos preços nos últimos 12 meses até maio. O preço dos produtos agrícolas cresceu 37,9%, o dos metais subiu 63,8% e o dos combustíveis fósseis 78,9%.

Um terceiro elemento agravante da atual situação do Brasil (e do mundo) é que alguns setores estão enfrentando sérios problemas para adquirir insumos, como microprocessadores, polímeros, metais e celulose. O grande motivo é a desorganização das cadeias produtivas nacionais e globais, resultado da pandemia de Covid-19. Naturalmente, a falta dos insumos também influencia no aumento dos preços. E olhe que um quarto agravante se avizinha: o encarecimento da energia por falta de chuvas...

Agora, retornemos ao chamado “canal das expectativas” para controle da inflação. Resumidamente, ele funciona assim: o BC consulta o “mercado”, ou seja, um seleto grupo de instituições financeiras, sobre o que eles acham que vai acontecer com a inflação no futuro, por exemplo. Se a expectativa é de alta dos preços, o BC deve demonstrar força hoje e tomar medidas para conter a inflação que o “mercado” acha que vai ter amanhã (de uma forma geral, isto significa que a taxa de juros deve subir). Assim, o BC estaria dando um dos sinais da sua credibilidade. Sem meias palavras: o “canal das expectativas” é um mecanismo onde um seleto grupo de instituições financeiras influenciam o BC a elevar a taxa básica de juros, um dos índices que servem para remunerar as próprias instituições financeiras... Não parece uma raposa tomando conta do galinheiro?

Pois bem, se o Copom elevar novamente os juros, diante do cenário no qual os determinantes da inflação estão além da influência da autoridade monetária, revela-se o mistério da atuação do nosso BC independente: atender os interesses do “mercado”. Eu quero é novidade...


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

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