quarta-feira, 30 de junho de 2021

Aguenta, Brasil!

Semana de 21 a 27 de junho de 2021

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

O noticiário econômico da semana que passou foi bastante informativo. Por exemplo, saiu o Relatório de Inflação do Banco Central. Nele, confirma-se que o bicho papão que assusta o BC são as expectativas. Em outras palavras, o que faz os juros subirem hoje é a promessa de que a inflação de hoje pode “criar” inflação no futuro. Esta é a terceira semana seguida que falamos do tema. No campo econômico isto é importante, pois a atuação da nossa autoridade monetária independente revela muito sobre o que esperar dela no futuro.

 No referido Relatório, alguns aspectos merecem ser destacados. Há o entendimento de que a economia está quase bem. Chegamos ao mesmo nível de produção de antes da Pandemia (fim de 2019). Mas ainda estamos abaixo dos valores de 2014.

No geral, os dados do PIB do primeiro trimestre de 2021 foram positivos: a produção cresceu 1,2% em relação ao fim de 2020. Mas esses números ainda estão bastante fracos. A Indústria cresceu apenas 0,7% e os Serviços, 0,4%. Pelo lado dos gastos, tanto Famílias quanto o Governo reduziram seu Consumo (-0,1% e -0,8%, respectivamente). Os Investimentos e as Importações foram inflados por ajustes (manobras) contábeis. O único componente que ficou indiscutivelmente bem foi o das Exportações. Graças às commodities as vendas externas cresceram 3,7%.

Para além desses elementos, o Relatório aponta que outros aspectos fazem o BC acreditar que o PIB do Brasil vá crescer 4,6% em 2021 (antes a previsão era de 3,6%). Os motivos são: a melhora da confiança dos agentes econômicos, a promessa de que serão efetivadas políticas públicas de manutenção do emprego e da renda e a promessa de que a vacinação no Brasil vai deslanchar. Deixo ao caro leitor a dúvida: dá pra acreditar?

Outro dado que é trazido no Relatório retrata a situação do mercado de força de trabalho. A situação da população brasileira é crítica. Apesar da discrepância nos dados, ainda não retornamos ao patamar pré-Pandemia. Na realidade, é preciso que 8,9 milhões de pessoas voltem a trabalhar para que a ocupação total retorne ao patamar do fim de 2019, quando tínhamos 94,6 milhões de trabalhadores ocupados. Inclusive, segundo levantamento do Valor Data com 28 empresas, o desemprego no Brasil deve apresentar um recorde histórico em 2021. Espera-se que 14,3% da força de trabalho esteja desocupada na média ao longo do ano. Ou seja, estamos vendo uma recuperação da economia, mas sem uma consistente inclusão dos trabalhadores nesse processo.

Um fator considerado positivo no Relatório do BC é a situação fiscal brasileira entre janeiro e abril de 2021. Se nos 12 meses do ano passado o governo brasileiro gastou R$ 83 bilhões a mais do que arrecadou (apresentou déficit no orçamento), nos 4 primeiros meses de 2021 o superávit (saldo positivo) no orçamento foi de R$ 76 bilhões. Houve tanto aumento nas receitas quanto redução nas despesas. Mas a previsão é que isto não se perpetue, já que muitos gastos foram retidos no começo do ano (porque o orçamento demorou para ser aprovado) e eles devem ser liberados até o fim do ano.

Por fim, vem a inflação no Relatório do BC. Da variação de 2,08% acumulada entre março e maio de 2021 no IPCA, mais da metade foi de responsabilidade dos preços administrados. Desses, os que mais contribuíram para o aumento nos preços foram produtos do petróleo, farmacêuticos e energia elétrica. Segundo o relatório, houve uma “surpresa altista” gerada pelo preço das commodities. A redução no câmbio não trouxe o resultado previsto de melhoria nos preços internos.

Diante desses e de outros aspectos levantados no Relatório do BC, eles foram enfáticos: mesmo que retarde o crescimento, mesmo que aumente o desemprego, o Banco Central vai continuar com a atual política de elevação da Selic. E se as expectativas piorarem, como eles mesmos disseram, o aperto será ainda maior.

Aguenta, Brasil!

Ah, lembrando que 3 de julho vai ser maior...


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

Share:

0 comentários:

Postar um comentário

Novidades

Recent Posts Widget

Postagens mais visitadas

Arquivo do blog