Semana de 12 a 18 de fevereiro de 2024
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
O
carnaval acabou e a semana passada sequer teve três dias úteis. Normalmente,
pouca coisa muda na economia brasileira durante tais festejos. Por isso,
seguiremos a série de textos sobre a política industrial chamada de Nova
Indústria Brasil (NIB). Hoje, falaremos do chamado “gap” ou “hiato”
tecnológico.
Termos
muito utilizados no “economês”, o “gap” e o “hiato” são duas palavras usadas
para expressar a mesma coisa: a diferença entre o valor real de uma variável e
o seu valor ideal (previsto, estimado ou considerado de excelência). No caso da
tecnologia, os termos “gap” e “hiato” servem para expressar o diferencial entre
o nível de desenvolvimento tecnológico alcançado por um país e os padrões
alcançados pelas economias mais avançadas. Quanto maior o hiato (ou gap), maior
o atraso do país em questão.
Há
diversas formas de mensurar o hiato tecnológico, desde a participação dos
setores de média e alta tecnologia no PIB, no emprego, na renda, nas
exportações e na P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), até o número de patentes
registradas e inovações implementadas a cada ano. Disto podemos deduzir: os
países que já dispõem de infraestrutura técnica-científica-produtiva avançada
são aqueles que lideram o desenvolvimento industrial mundial.
No
capitalismo, a pesquisadora Carlota Perez apontou cinco grandes revoluções
tecnológicas que mudaram o curso da História e criaram novos paradigmas:
Revolução Industrial; Era do vapor e ferrovias; Era do aço e engenharia pesada;
Era do petróleo, automóveis e produção em massa; e Era da informática e
telecomunicações. Dessas, o Brasil internalizou em seu território a estrutura
produtiva das quatro primeiras, mas de forma muito desigual, dependente e
descompassada. Só não internalizou a estrutura produtiva capaz de garantir a
reprodução das tecnologias da informação e da comunicação (TIC). E isto é um
grave problema.
Em
todas as Eras, por mais que mudassem as tecnologias líderes, os produtos das
tecnologias antigas eram incorporados ou “reinventados” a partir das novas.
Inovação também é isso, fazer a mesma coisa, só que diferente. Por exemplo,
mesmo com a Era dos automóveis, uma parte significativa dos transportes
continuou a ocorrer em navios e trens. Com o advento da Era da informação foi a
mesma coisa: colheitadeiras à diesel passaram a trabalhar sem a necessidade de
motoristas, pois começaram a ser guiadas por redes móveis e GPS.
Por
sua vez, tudo leva a crer que o próximo paradigma tecnológico está ligado à
“economia verde” e às suas aplicações. Por exemplo, o transporte de cargas e
pessoas ainda vai existir de maneira muito parecida com o que temos hoje. A
diferença é que os motores à combustão serão substituídos por elétricos, e os
motoristas, trocados pelos computadores. Enquanto isso, os recursos renováveis
certamente se tornarão a base da geração de energia. Hoje, cerca de 80% de toda
energia que move o mundo vem do petróleo e derivados, do carvão e do gás
natural.
Como
já vimos, para ter e desenvolver algo ligado aos novos paradigmas, é necessário
ter know-how, ou seja, acumular elementos da infraestrutura
técnico-científica-produtiva, baseada em tecnologias de ponta. O problema é que
o Brasil tem um hiato tecnológico elevado, o que limita nosso crescimento de
curto prazo.
Em
primeiro lugar, o Brasil viu sua indústria definhar nos últimos 30 anos,
através daquilo que chamamos de desindustrialização. Em segundo, essa indústria
não deu o passo seguinte na implementação de novas fábricas produtoras de
máquinas para outras fábricas. Isso é ainda pior com aquelas que fornecem o
maquinário produtor das TIC. Em terceiro, vimos uma redução brutal das verbas
públicas destinadas à pesquisa e à inovação, em especial após o Golpe de 2016.
Sem falar que, em 2022, batemos recorde na “fuga de cérebros” para o exterior.
Diante
do que foi levantado, alguns problemas se apresentam de maneira urgente: como
realizar a transição de uma estrutura produtiva atrasada para uma
(relativamente) avançada? Será possível “queimar” etapas e chegar à economia
verde sem termos sólidas bases nas TIC? Como convencer nossa burguesia de que
isso pode ser rentável pra ela? Como outros países mais avançados podem ser
aproveitados (ou aproveitadores) nesse processo?
Resumindo, para o Brasil avançar, é preciso muito planejamento e engenharia econômica, para encontrar aqueles que certamente serão os gargalos da NIB. Caso contrário, continuaremos atrasados e, por isso, dependentes de empresas estrangeiras, para vermos nossa economia funcionar. Esse é outro dilema...
[i] Professor
do DRI/UFPB, PPGCPRI/UFPB e PPGRI/UEPB. Coordenador do PROGEB (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com).
Colaboraram os pesquisadores: Valentine de Moura,
Gustavo Figueiredo, Raquel Lima e Paola Arruda.
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