Semana de 22 a 28 de junho de 2009
Nas últimas análises, temos demonstrado que a tendência para a desaceleração da crise continuou a acentuar-se. Na teoria, isto significa a passagem da fase de crise para a fase de depressão do ciclo econômico. Continuamos a caminhada para o fundo do poço, mas a um ritmo mais lento. As insolvências e falências de empresas se reduzem, o desemprego tende a estabilizar-se, a demanda continua em baixa e o crédito, diante da falta geral de confiança que se mantém, apesar de continuarem as injeções violentas de recursos públicos nas instituições financeiras e empresas, continua escasso.
O Banco Central Europeu (BCE), por exemplo, anunciou mais uma injeção de 442 milhões de euros (US$ 617 bilhões), no sistema bancário europeu, a uma taxa de 1% ao ano. Nos EUA, o mercado imobiliário continua em crise e o Federal Reserve (Fed), Banco Central americano, continua cauteloso, prevendo uma lenta recuperação da economia apenas em 2010. A carteira de credito de difícil recuperação, nos últimos nove meses, saltou para US$ 2,03 trilhões. O Fed anunciou que gastará mais US$ 1,25 trilhão em papeis hipotecários. Com isto, os créditos duvidosos passarão a representar quase 10% do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA. Prevê-se que a dívida pública do país saltará, de US$ 6,3 trilhões, para US$ 10 trilhões até o próximo ano, o que equivale a oito PIB’s do Brasil.
O Banco Mundial (Bird) reviu sua previsão do crescimento da economia mundial para este ano de 2009. A queda de 1,7%, prevista anteriormente, foi corrigida para 2,9%. O Fundo Monetário Internacional (FMI), mais otimista, estimou a queda em 1,3%. A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) embora admitindo que, em 2010, a economia mundial possa iniciar a sua recuperação, considera que, em 2009, a economia dos países da zona do euro terá uma retração de 5% e que continuará estagnada no próximo ano.
Os sinais de desaceleração da crise, que caracterizam a passagem para a nova fase do ciclo, têm provocado alguma euforia no setor financeiro, o grande responsável pela deflagração do processo. Já se nota certa excitação nos centros financeiros mundiais, abastecidos pela enxurrada de recursos vindos dos bancos centrais dos países desenvolvidos. Entretanto, reunidos na Basiléia, os presidentes e representantes destes bancos alertam que é cedo para declarar a vitória sobre a pior recessão dos últimos 60 anos e continuam a debater as medidas que possam prevenir novos desastres.
No Brasil, o governo finalmente deu fortes demonstrações de preocupação acionando um pacotão de medidas anticíclicas, mostrando que a equipe do Ministro “Mantega” estudou “direitinho” os manuais keynesianos. Os bancos oficiais (BB e CEF) despejam dinheiro tentando baixar os juros, que nem de longe acompanham os do resto do mundo. A contragosto, também o Banco Central do Brasil (BCB) vai baixando lentamente a taxa Selic, que caiu para o terceiro lugar no ranking mundial das mais elevadas. Por seu lado, o governo reduziu os impostos sobre vários produtos, como os automóveis e a linha branca, ao mesmo tempo em que tenta empurrar o enferrujado PAC (que se arrasta) e lançar o plano da casa própria.
As medidas tomadas para combater a crise, como o aumento das despesas, a liberação de recursos e as desonerações fiscais, em contrapartida, elevaram para R$ 1,388 trilhão o déficit das contas públicas em maio, em relação a abril, o que significou um aumento de 0,31%. Só não foi pior por que a valorização do real fez cair a dívida externa. Os juros não pagos e incorporados ao principal atingiram R$ 10,03 bilhões. Entre abril e maio, o resultado primário das contas públicas apresentou um déficit de R$ 120,2 milhões, o primeiro para este mês desde 1999. De janeiro a maio, as despesas cresceram 18,6% e as receitas caíram 0,85%. Como conseqüência, a tão falada relação Dívida-PIB, que, segundo as autoridades monetárias, deveria dar tranqüilidade aos “investidores”, começou a subir, pondo em dúvida a solvência do setor público. Isto, por sua vez, pode provocar a fuga do “hot money” dos especuladores da bolsa de valores e a desvalorização do real, devido à redução da oferta de dólares. De janeiro até agora, o superávit primário já caiu de 4,7%, para 1,6%, e ainda faltam seis meses para o final do ano.
Eis um novo perigo que surge e coloca as autoridades econômicas entre a cruz e a espada.
Apesar de todo o esforço do governo, as previsões para o crescimento do PIB nacional continuam sendo reduzidas. A Confederação Nacional da Indústria considera que o PIB do país cairá 0,4%. O BC deverá rever sua previsão de crescimento, de 1,2%, para uma taxa entre 0,3% e 0,5%. O Banco Mundial (Bird) estima uma queda de 1,1%. A maior parte das opiniões indica valores em torno de 0%.
Os acontecimentos dividiram os analistas em três grandes grupos. Os otimistas, apressados em defender o sistema, afirmam que a crise já passou e a economia está em recuperação.Os envergonhados atrevem-se a dizer que já chegamos ao fundo do poço. O terceiro grupo constata que a desaceleração se reduziu, mas que ainda não se chegou ao fundo do poço e que a crise, portanto, não acabou. Esta é a opinião do Secretário Geral da OCDE, Angel Gurria. O presidente do BCB, Henrique Meirelles, finalmente admitiu a gravidade da crise e que “a recuperação é lenta, gradual e sujeita ainda a muitas dificuldades”, embora considere que “o pior da crise” já passou, no Brasil.
No entanto, os dados nos levam a prever que a recuperação ainda não começou e, quando se iniciar, será lenta e arrastada. A brutal injeção de recursos que vem sendo feita tem o efeito perverso de não permitir a ação saneadora da crise, que é a destruição de capitais e de forças produtivas. Sem esta destruição, não haverá espaço para investimentos em máquinas e equipamentos e, com isto, o setor produtor de meios de produção, o grande responsável pela recuperação, não será estimulado.
Ora, as preocupações com o setor de bens de capital já vêm de algum tempo. A valorização do real frente ao dólar já colocava, anteriormente, em condições de desvantagem a produção nacional diante do setor externo. Os produtos chineses, por exemplo, favorecidos pelas baixas remunerações da força de trabalho praticadas naquele país e pela inexistência de contribuições sociais que incidem sobre a folha de salários, podiam ser comercializados por preços muito baixos. Isto, aliado às taxas de juros altas, ao reduzido tamanho do mercado interno e ao panorama internacional de crise, vinha desestimulando os investimentos pelos empresários nacionais. Com a crise, a situação agravou-se consideravelmente. Armando Monteiro Neto, presidente da Confederação Nacional das Indústrias (CNI) citando dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que, de janeiro a abril, enquanto a indústria registrou uma queda de 14,7%, a produção de bens de capital caiu 22,6%. A Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), apontando as dificuldades do setor, mostrou que, enquanto a taxa de juros aplicada no Brasil, a TJLP, é de 6,00% ao ano, as empresas estrangeiras operam com taxas de 1,5% a 3,0%. Monteiro Neto afirmou ainda que os sinais de recuperação são tênues e a retomada mostra-se difícil. Se não houver uma “política dedicada a bens de capital, estará comprometido, não só o crescimento presente, mas também o potencial do PIB dos próximos anos”.
Os demais dados sobre a economia são característicos de uma fase de recessão. No período de janeiro a maio, a inadimplência das empresas cresceu 27%. Entre abril e maio, ela subiu, de 5,2%, para 5,5%, nos empréstimos bancários, o maior percentual desde outubro de 2000. O consumo de energia elétrica, em maio, caiu 4,4% em relação ao mesmo mês do ano passado; a taxa de desemprego manteve-se estacionada em 15,3%, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e em 8,8%, segundo o IBGE. Enquanto as empresas de celulose choram a perda de 50% de seu valor, a indústria automotiva, privilegiada pelo corte do IPI, proclama o melhor nível das vendas da história, em junho, embora o calote no pagamento das prestações dos carros seja o mais alto desde 2000. E o governo, apesar do aumento do déficit das contas públicas, continuou a privilegiar a indústria automotiva anunciando a prorrogação da isenção do IPI por mais três meses. Prometeu também outras benesses natentativa de estimular a recuperação econômica.
O fato é que enquanto as leis e as contradições do capitalismo exercem sua ação, o presidente Lula, entre a cruz e a espada, precisa desesperadamente de indicadores econômicos positivos, para a campanha política e, embora com atraso, está disposto a jogar pesado. Depois das eleições, o fardo será carregado por quem o suceder.
Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do Progeb - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira
progeb@ccsa.ufpb.br
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O Banco Central Europeu (BCE), por exemplo, anunciou mais uma injeção de 442 milhões de euros (US$ 617 bilhões), no sistema bancário europeu, a uma taxa de 1% ao ano. Nos EUA, o mercado imobiliário continua em crise e o Federal Reserve (Fed), Banco Central americano, continua cauteloso, prevendo uma lenta recuperação da economia apenas em 2010. A carteira de credito de difícil recuperação, nos últimos nove meses, saltou para US$ 2,03 trilhões. O Fed anunciou que gastará mais US$ 1,25 trilhão em papeis hipotecários. Com isto, os créditos duvidosos passarão a representar quase 10% do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA. Prevê-se que a dívida pública do país saltará, de US$ 6,3 trilhões, para US$ 10 trilhões até o próximo ano, o que equivale a oito PIB’s do Brasil.
O Banco Mundial (Bird) reviu sua previsão do crescimento da economia mundial para este ano de 2009. A queda de 1,7%, prevista anteriormente, foi corrigida para 2,9%. O Fundo Monetário Internacional (FMI), mais otimista, estimou a queda em 1,3%. A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) embora admitindo que, em 2010, a economia mundial possa iniciar a sua recuperação, considera que, em 2009, a economia dos países da zona do euro terá uma retração de 5% e que continuará estagnada no próximo ano.
Os sinais de desaceleração da crise, que caracterizam a passagem para a nova fase do ciclo, têm provocado alguma euforia no setor financeiro, o grande responsável pela deflagração do processo. Já se nota certa excitação nos centros financeiros mundiais, abastecidos pela enxurrada de recursos vindos dos bancos centrais dos países desenvolvidos. Entretanto, reunidos na Basiléia, os presidentes e representantes destes bancos alertam que é cedo para declarar a vitória sobre a pior recessão dos últimos 60 anos e continuam a debater as medidas que possam prevenir novos desastres.
No Brasil, o governo finalmente deu fortes demonstrações de preocupação acionando um pacotão de medidas anticíclicas, mostrando que a equipe do Ministro “Mantega” estudou “direitinho” os manuais keynesianos. Os bancos oficiais (BB e CEF) despejam dinheiro tentando baixar os juros, que nem de longe acompanham os do resto do mundo. A contragosto, também o Banco Central do Brasil (BCB) vai baixando lentamente a taxa Selic, que caiu para o terceiro lugar no ranking mundial das mais elevadas. Por seu lado, o governo reduziu os impostos sobre vários produtos, como os automóveis e a linha branca, ao mesmo tempo em que tenta empurrar o enferrujado PAC (que se arrasta) e lançar o plano da casa própria.
As medidas tomadas para combater a crise, como o aumento das despesas, a liberação de recursos e as desonerações fiscais, em contrapartida, elevaram para R$ 1,388 trilhão o déficit das contas públicas em maio, em relação a abril, o que significou um aumento de 0,31%. Só não foi pior por que a valorização do real fez cair a dívida externa. Os juros não pagos e incorporados ao principal atingiram R$ 10,03 bilhões. Entre abril e maio, o resultado primário das contas públicas apresentou um déficit de R$ 120,2 milhões, o primeiro para este mês desde 1999. De janeiro a maio, as despesas cresceram 18,6% e as receitas caíram 0,85%. Como conseqüência, a tão falada relação Dívida-PIB, que, segundo as autoridades monetárias, deveria dar tranqüilidade aos “investidores”, começou a subir, pondo em dúvida a solvência do setor público. Isto, por sua vez, pode provocar a fuga do “hot money” dos especuladores da bolsa de valores e a desvalorização do real, devido à redução da oferta de dólares. De janeiro até agora, o superávit primário já caiu de 4,7%, para 1,6%, e ainda faltam seis meses para o final do ano.
Eis um novo perigo que surge e coloca as autoridades econômicas entre a cruz e a espada.
Apesar de todo o esforço do governo, as previsões para o crescimento do PIB nacional continuam sendo reduzidas. A Confederação Nacional da Indústria considera que o PIB do país cairá 0,4%. O BC deverá rever sua previsão de crescimento, de 1,2%, para uma taxa entre 0,3% e 0,5%. O Banco Mundial (Bird) estima uma queda de 1,1%. A maior parte das opiniões indica valores em torno de 0%.
Os acontecimentos dividiram os analistas em três grandes grupos. Os otimistas, apressados em defender o sistema, afirmam que a crise já passou e a economia está em recuperação.Os envergonhados atrevem-se a dizer que já chegamos ao fundo do poço. O terceiro grupo constata que a desaceleração se reduziu, mas que ainda não se chegou ao fundo do poço e que a crise, portanto, não acabou. Esta é a opinião do Secretário Geral da OCDE, Angel Gurria. O presidente do BCB, Henrique Meirelles, finalmente admitiu a gravidade da crise e que “a recuperação é lenta, gradual e sujeita ainda a muitas dificuldades”, embora considere que “o pior da crise” já passou, no Brasil.
No entanto, os dados nos levam a prever que a recuperação ainda não começou e, quando se iniciar, será lenta e arrastada. A brutal injeção de recursos que vem sendo feita tem o efeito perverso de não permitir a ação saneadora da crise, que é a destruição de capitais e de forças produtivas. Sem esta destruição, não haverá espaço para investimentos em máquinas e equipamentos e, com isto, o setor produtor de meios de produção, o grande responsável pela recuperação, não será estimulado.
Ora, as preocupações com o setor de bens de capital já vêm de algum tempo. A valorização do real frente ao dólar já colocava, anteriormente, em condições de desvantagem a produção nacional diante do setor externo. Os produtos chineses, por exemplo, favorecidos pelas baixas remunerações da força de trabalho praticadas naquele país e pela inexistência de contribuições sociais que incidem sobre a folha de salários, podiam ser comercializados por preços muito baixos. Isto, aliado às taxas de juros altas, ao reduzido tamanho do mercado interno e ao panorama internacional de crise, vinha desestimulando os investimentos pelos empresários nacionais. Com a crise, a situação agravou-se consideravelmente. Armando Monteiro Neto, presidente da Confederação Nacional das Indústrias (CNI) citando dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que, de janeiro a abril, enquanto a indústria registrou uma queda de 14,7%, a produção de bens de capital caiu 22,6%. A Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), apontando as dificuldades do setor, mostrou que, enquanto a taxa de juros aplicada no Brasil, a TJLP, é de 6,00% ao ano, as empresas estrangeiras operam com taxas de 1,5% a 3,0%. Monteiro Neto afirmou ainda que os sinais de recuperação são tênues e a retomada mostra-se difícil. Se não houver uma “política dedicada a bens de capital, estará comprometido, não só o crescimento presente, mas também o potencial do PIB dos próximos anos”.
Os demais dados sobre a economia são característicos de uma fase de recessão. No período de janeiro a maio, a inadimplência das empresas cresceu 27%. Entre abril e maio, ela subiu, de 5,2%, para 5,5%, nos empréstimos bancários, o maior percentual desde outubro de 2000. O consumo de energia elétrica, em maio, caiu 4,4% em relação ao mesmo mês do ano passado; a taxa de desemprego manteve-se estacionada em 15,3%, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e em 8,8%, segundo o IBGE. Enquanto as empresas de celulose choram a perda de 50% de seu valor, a indústria automotiva, privilegiada pelo corte do IPI, proclama o melhor nível das vendas da história, em junho, embora o calote no pagamento das prestações dos carros seja o mais alto desde 2000. E o governo, apesar do aumento do déficit das contas públicas, continuou a privilegiar a indústria automotiva anunciando a prorrogação da isenção do IPI por mais três meses. Prometeu também outras benesses natentativa de estimular a recuperação econômica.
O fato é que enquanto as leis e as contradições do capitalismo exercem sua ação, o presidente Lula, entre a cruz e a espada, precisa desesperadamente de indicadores econômicos positivos, para a campanha política e, embora com atraso, está disposto a jogar pesado. Depois das eleições, o fardo será carregado por quem o suceder.
Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do Progeb - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira
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