quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

De Porto Alegre à Davos


Semana de 22 a 28 de janeiro de 2018


Nelson Rosas Ribeiro[i]

           
Enquanto o presidente Temer passeia em Davos na Suíça, em Porto Alegre corre o julgamento do ex-presidente Lula. Foi este julgamento que ocupou todas as manchetes da mídia. Para a alegria da classe empresarial (leia-se burguesia) o esperado aconteceu. O veredicto ensaiado foi proclamado e, por 3 x 0, o ex-presidente foi condenado a uma pena ainda maior. A novela não está encerrada, mas tudo caminha para a punição de Lula e com ela o encerramento da grande missão da lava-jato que poderá ser concluída.
A grande farsa estará completa e a lição foi dada: todos podem ser corruptos menos os representantes dos trabalhadores. A conciliação de classes e a pacificação de burgueses e proletários têm mais um capítulo encerrado. A social democracia é demasiado perigosa para a conservadora e reacionária burguesia brasileira. A classe trabalhadora que se prepare para o pau que vai quebrar.
A reação dos empresários e políticos foi imediata. Publicam os jornais que “surgiu no meio corparativo uma espécie de euforia”. Muitos falam em antecipar investimentos e conclamam por uma política “liberal”. Afirmam os empresários: “A condenação unânime nos leva mais perto de um país com o qual sonhamos”.
Esta euforia materializou-se em números. Os “mercados” comemoraram e a bolsa subiu. O Ibovespa teve alta de 3,72% e, pela primeira vez na história, subiu acima de 83 mil pontos. O dólar caiu 2,4% para R$3,157 e o dólar futuro também caiu mais de 3% chegando a 2,81% no final do dia.
Além das repercussões econômicas do julgamento poucas são as notícias. Os sinais da lenta recuperação interna continuam a ser observados. Lamenta-se a falta de investimentos do governo e do crédito para as empresas. As grandes empresas são as que mais lamentam embora a queda nos juros anime a todos. Do lado do consumo, nota-se alguma recuperação ajudada pela queda da inflação e dos juros, mas estes fatores ainda não foram suficientes para mudar a percepção de bem estar das famílias, principalmente das chamadas classes C, D e E. Segundo pesquisas estas famílias consideram sua situação tão má quanto em 2015 e a queda da inflação ainda não foi sentida sem falar nos 12,6 milhões de pessoas que permanecem desempregadas.
A nível internacional a cena foi ocupada pelo 48º Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos na Suíça, que reuniu grandes empresários e dirigentes de muitos países do mundo entre os quais o presidente Temer, que lá foi para tentar vender o Brasil para os “investidores”. Apesar do sentimento geral de década perdida, desde a crise de 2008, foi consenso a recuperação da economia mundial. Observou-se, porém, o temor de que uma nova grande crise está em gestação e que pode ser provocada por um acidente. Lamentou-se que os “órgãos reguladores dos mercados têm agora pouca munição para enfrentar uma eventual crise”. Houve muitas declarações de grandes executivos e acadêmicos. David Rubenstein do grupo Carlyle afirmou pessimista: “quando as pessoas estão muito felizes e contentes, alguma coisa ruim acontece”. Kenneth Rogoff, de Harvard, mostrou preocupação com a China identificando, no país, características de construção de uma crise financeira. Bill Rhodes, do Citibank, apontou uma séria de sinais semelhantes a 2007 e criticou o otimismo exagerado do mercado.
Em análises anteriores já alertamos pra o retorno da fase da crise no ciclo econômico. No mundo já ronda a percepção do fenômeno embora ninguém consiga explicar as causas. Tudo parece ser obra do acaso. Vamos esperar para ver.
Enquanto esperamos a economia, esperamos os novos capítulos da disputa jurídica do caso Lula. As batalhas serão transferidas para os tribunais superiores, o STJ e o STF. E novos processos contra o ex-presidente estão a caminho. Um juiz de Minas Gerais, por conta da “operação Zelotes” mandou apreender o passaporte de Lula que ficou impedido de participar de um fórum internacional na Etiópia. Ao mesmo tempo processos contra outros políticos andam a passo de tartaruga ou são arquivados.
As aberrações do poder Judiciário brasileiro transformam-se em escândalo internacional prejudicando ainda mais a já desgastada imagem do país.


[i] Professor Emérito da UFPB e Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).
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