sábado, 14 de junho de 2025

DOR NA PALESTINA, FELICIDADE (AINDA INCOMPLETA) NO BRASIL

Semana de 02 a 08 de junho de 2025

   

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Caro leitor, antes de iniciar a análise propriamente dita, preciso destacar dois temas que trazem sentimentos opostos.

O primeiro é a, cada vez mais, escancarada ação genocida do Estado de Israel contra a população da Palestina. Se, desde o começo, a desproporção do ataque do Estado judeu já foi flagrante, não é de hoje que o que tem acontecido por lá se transformou em um massacre abominável. Campos de concentração, há. Pessoas passando fome, também. O que está faltando para que isto seja chamado de holocausto palestino, câmara de gás?

 O segundo tema a ser destacado é que, nesta semana que ainda não terminou, não há a menor possibilidade de qualquer brasileiro com o mínimo de intelecto escrever algo e não falar do prazer em ver militares sentados no banco dos réus da justiça civil. É muita alegria ver um troglodita, metido a corajoso, se amofinar diante de um juizado composto pela Suprema Corte do país. Nesse momento, para além das lembranças de toda a pressão contra as Eleições de 2022, vem à mente, também, o conjunto de iniquidades praticadas por Bolsonaro durante a pandemia de Covid-19. É possível que, pela primeira vez na nossa história, vejamos uma rápida (mesmo que tímida) resposta às atrocidades praticadas por militares brasileiros. Para termos a cereja em cima do bolo, só faltaria mesmo a burguesia que o apoiou pagar junto. Mas, eu sei, isto é querer demais... Enfim, vamos aos fatos da semana que já acabou.

 Como já foi trazido na análise passada, há uma verdadeira guerra de narrativas acerca dos fatos sobre a economia brasileira. Os dados mostram uma melhora significativa em várias dimensões, desde a queda na desigualdade de renda até o aumento nos investimentos e nas exportações. Porém, os noticiários vivem afirmando que isto é um problema para o país, que não deveríamos crescer tanto e gerar tanto emprego.

De acordo com os dados oficiais do IBGE, a economia brasileira cresceu 1,4% entre o último trimestre de 2024 e o primeiro trimestre de 2025. No contexto das confusões internacionais, lideradas por Donald Trump, nosso crescimento foi maior do que o da União Europeia (0,3%) e o do G7 (0,1%), ficando atrás, contudo, de outros países emergentes, como a China (5,4%).

Detalhando um pouco, é importante destacar que houve uma forte contribuição da Agropecuária no crescimento geral, que saltou 12,2% no período. Esta cifra reflete uma recuperação da forte queda do fim do ano passado (-4,4%). No caso dos Serviços, não houve uma mudança significativa em relação ao período anterior, crescendo 0,3% nesses primeiros meses de 2025. Contudo, a Indústria de Transformação foi o ponto negativo, literalmente, tendo em vista que o PIB do setor caiu 1,0%. Por sua vez, a Construção Civil reduziu em 0,8% seu PIB. A situação geral da Indústria só não foi pior por causa da Indústria Extrativa (+2,1%) e dos Serviços Industriais de Utilidade Pública (+1,5%).

Para encerrar a descrição dos dados sobre o PIB, alguns componentes da demanda foram destaques positivos: os aumentos de 3,1% nos Investimentos e de 2,9% nas Exportações. Isto mostra maior pujança da atividade econômica, pois corresponde, por um lado, a um aumento na capacidade produtiva, nas contratações e na geração de renda, e, por outro, a um aumento nas vendas internacionais, o que traz uma maior quantidade de dólares para o país. Contudo, o aumento de 5,9% nas Importações reflete uma fraqueza de longa data na estrutura produtiva brasileira. Nas últimas décadas, sempre que precisamos crescer, tivemos que comprar mais do resto do mundo por falta de capacidade produtiva interna. Isto se reflete, sempre, no aumento da inflação.

Bom, reforçando o que já foi dito em análises anteriores, em especial a da semana passada, não dá para encontrar uma conexão crível entre os fatos e a narrativa que tem sido criada sobre a economia do Brasil. Muito longe do ideal, as políticas que estão sendo adotadas buscam romper a perversa lógica da contenção da inflação pelo sufocamento da economia. O problema é que, como têm mostrado as pesquisas de intenção de votos, parece que isto não chega plenamente à realidade das pessoas. Mas aí o problema já é outro, está no próprio capitalismo.

Deixemos essa discussão para outro dia...


[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Antonio Fontes, Bruno Lins, Camylla Martins, Guilherme de Paula,  Lara Souza, Nelson Rosas, Rosângela Palhano e Victoria Rodrigues.

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sexta-feira, 6 de junho de 2025

O BRASIL À BEIRA DO COLAPSO? A VERDADE CAMUFLADA PELO JORNALISMO ECONÔMICO

Semana de 26 de maio a 01 de junho de 2025

   

Rosângela Palhano Ramalho[1]

 

Estimado leitor, diante dos últimos dados publicados sobre a conjuntura econômica, não temos outra escolha a não ser continuar denunciando a intensa sabotagem pela qual vem passando o governo brasileiro neste âmbito. Mesmo diante dos excelentes resultados econômicos, a imprensa brasileira, através de suas manchetes, crava o discurso de que o crescimento econômico é ruim para o país. É impressionante como o dogma econômico do combate ao mal inflacionário (a inflação está acima da meta, mas não há descontrole) foi assimilado ao ponto das opiniões teóricas divergentes e dos afetados pelas decisões de política econômica serem totalmente vetados pela imprensa. Quando os juros se alteram, não escutam os setores comercial e produtivo; quando o desemprego cai e/ou a renda aumenta, não escutam os trabalhadores ou os seus sindicatos; quando se introduz políticas sociais, não se ouve os beneficiados e as transformações que elas produzem em suas vidas. Todas essas vozes foram caladas. Ouve-se apenas um lamento: crescer gera inflação. E inflação deve ser combatida pelo asfixiamento da demanda. O jornalismo econômico virou o samba de uma nota só.

Assim como diz a canção de Tom Jobim, a imprensa não quis todas as notas e, para não correr o risco de ficar sem nenhuma, escolheu ficar numa nota só... Mas não estamos falando de amor, e sim da economia. E ela é complexa. Os recentes resultados econômicos foram bons e aqui os apresento. O IBC-Br, indicador do PIB calculado pelo Banco Central, avançou 1,3% no primeiro trimestre; a produção agroindustrial cresceu 3,6% em março pela terceira vez seguida e fechou o primeiro trimestre com aumento de 1,6%, segundo Índice de Produção Agroindustrial da FGV Agro; o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) apurou abertura líquida de 257.528 vagas de trabalho com carteira assinada em abril, resultado bem acima das 170.513 vagas previstas pelo Valor Data; o Índice de Confiança do Comércio (Icom) da FGV está se recuperando e apresentou alta de 1,2 ponto em maio e chegou a 88,7 pontos (numa escala máxima de 200); o Índice de Confiança de Serviços (ICS) também da FGV, cresceu 1,5 ponto em maio, para 91,9 pontos; e, por fim, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), que é uma prévia da inflação, subiu 0,36% em maio ante 0,43% em abril, segundo o IBGE, e, de novo, o Valor Data errou, pois estimava crescimento de 0,44%.

Entretanto, todos estes resultados foram tratados no jornalismo como grandes decepções e/ou surpresas (negativas, é claro!). A realidade se comporta de forma diferente do que prevê o dogma teórico e ao invés de a teoria ser questionada, procura-se um culpado por ela não estar funcionando como deveria. O bode expiatório se reveza entre a resiliência da atividade econômica e Lula. A resiliência pode ser quebrada a qualquer momento pelos juros, então se pode conviver com ela, mas Lula precisa ser parado! Chega de inconsequências! Reajuste salarial dos servidores públicos? Política de valorização do salário-mínimo? Liberação do FGTS? Benefícios sociais? Isenção do Imposto de renda para quem ganha menos? Nada disso. Os teóricos dogmáticos e aqueles que são beneficiados por suas soluções econômicas encontraram a desculpa perfeita: a culpa é de Lula, o esbanjador que quer se reeleger.

Por isso, o jornalismo econômico e seus respectivos editoriais vendem a ideia de que uma tragédia está em curso pois “há a possibilidade de o PIB do Brasil crescer 3% em 2025” e, como “a economia vai continuar super resiliente”, isto “vai pressionar” a inflação. Não, não há pressão inflacionária. Isto é mentira. O PIB está crescendo e a inflação está caindo. É isto que as estatísticas mostram. A choradeira é vergonhosa. Contenham-se! Façam-se a seguinte pergunta: por que a economia cresce, apesar dos juros altos e com inflação sob controle?

Não. O Brasil não está à beira do colapso. Quem está colapsando são a teoria econômica e os rentistas que não suportam ver a inclusão do povo no orçamento da União.


[1] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; rospalhano@yahoo.com.br, rosangelapalhano31@gmail.com). Colaboraram: Lara Souza, Paola Arruda, Victória Rodrigues, Guilherme Gomes, Ícaro Moisés, Nelson Rosas, Brenda Tiburtino, Maria Júlia Alencar e Miguel Oliveira.


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domingo, 1 de junho de 2025

A LUTA CONTRA AS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS

Semana de 19 a 25 de maio de 2025

   

Nelson Rosas Ribeiro[i]

   

A questão da Selic, taxa básica de juros, que é estabelecida pelo Copom, órgão do Banco Central (BC), e que regula as taxas de juros da economia, tem sido tratada, nesta coluna, de diversos modos. Pode ser até repetitivo, mas a importância do assunto é tal que não podemos nos omitir, já que o Copom voltou a se reunir e estabelecer um novo patamar para a taxa: aumentou de 14,25% para 14,75%. O pior é que, mesmo com a mudança de vários diretores e do próprio presidente do BC, a política e as justificativas para o aumento continuam a ser as mesmas. Como a inflação, considerada como causada pelo excesso de demanda, tem sido “resiliente”, e continua a ameaçar a economia, o remédio para combatê-la, o único que o BC conhece, o aumento da taxa Selic, continua a ser aplicado. Dizem eles, que os juros elevados, fazem com que os consumidores deixem de consumir, as empresas deixem de investir, reduzindo com isto o seu consumo produtivo, e o governo também reprima sua política distributiva e de gastos. Em outras palavras, o remédio é aumentar o desemprego, diminuir os salários, dificultar os empréstimos e os investimentos, ou seja, desacelerar a economia. O BC lamenta que o crédito vem crescendo a dois dígitos, garantindo o ritmo de crescimento da economia. O comércio, a indústria e os serviços continuam a crescer, o mercado de trabalho permanece forte e os salários aumentaram em torno de 4%. As previsões para o PIB ultrapassaram os 4%. Isto é inadmissível.

É nesta frente que opera a Organização Criminosa, que atua no Banco Central e que, intencionalmente, trabalha para derrubar a economia, sendo aplaudida pela oposição, pois concorre para enfraquecer o governo e criar um ambiente negativo à reeleição do presidente Lula. Curiosamente, graças à estúpida ideologia econômica que adotam, economistas e partidários do presidente aliam-se a esta matilha de cães raivosos. Sobre os efeitos nefastos da elevação da Selic, para a economia, remeto os leitores para as duas últimas análises publicadas nesta coluna.

Mas, o BC está combativo e pede calma ao público, pois vai continuar a elevar a taxa Selic até conseguir derrubar os teimosos que insistem em manter o crescimento. E o único caminho é reduzir a demanda, pois a oferta não se pode aumentar, segundo um outro tabu: um tal de “produto potencial”.  Como o Brasil já atingiu o limite de seu produto potencial, se ultrapassá-lo, disparará a inflação sem controle. O Copom acalma o mercado afirmando que “… o processo de moderação de crescimento deve ocorrer, após vários anos de surpreendente dinamismo”.  O presidente do BC, Gabriel Galípolo, tranquiliza ainda mais o mercado prometendo que a Selic permanecerá elevada, “por um período bastante prolongado.” Enquanto a economia resistir, se mantiver resiliente, o Copom será implacável. Isso dito por eles próprios. Por isto, temos afirmado, que a Organização Criminosa que atua na direção do BC, é muito mais maléfica que o PCC ou o CV. Enquanto estes causam mal a algumas pessoas, aquela causa mal ao país e, portanto, à toda a população. São traidores da pátria.

Para tristeza geral, no entanto, a economia teima em não desacelerar. A Organização Criminosa que comanda o BC enfrenta um inimigo poderoso que trabalha na direção contrária. Fiel aos seus compromissos eleitorais o governo esforça-se para alimentar o crescimento da economia e melhorar as condições de vida da população com algum sucesso. A concessão de novos créditos avançou 18,2% para pessoas jurídicas e 12,5% para pessoas físicas, em março. Os consumidores, estimulados pela solidez do mercado de trabalho, estão dispostos ao endividamento e as empresas, além do crédito bancário, passaram a fazer captações no mercado de capitais. O aumento do salário-mínimo injetou mais R$81,5 bilhões na economia. A indústria cresceu, até agora, 1,9%. Em 12 meses, o varejo restrito expandiu-se 3,1% e o ampliado 3%. O governo criou o crédito consignado para o trabalhador privado, com garantia do FGTS, e uma linha de R$30 bilhões para uma nova faixa de renda do Minha Casa Minha Vida, para a classe média. Pretende estender o Gás para Todos, de 1,2 milhão de família, para 17 milhões e isentar do pagamento de luz os que consumem até 80kWh, que atinge 60 milhões de pessoas.

Como se pode ver, o governo não desiste e luta com bravura para manter o crescimento e cumprir seus compromissos com os mais necessitados. E além de tudo tem de travar a luta contra a outra Organização Criminosa, que não dá tréguas dentro do congresso.

Vida difícil a do governo Lula!


[i] Economista, Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Camylla Martins, Guilherme de Paula, Jessica Brito, Lara Souza, Paola Arruda, Victoria Rodrigues e Ryann Felix.




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sábado, 24 de maio de 2025

DOGMA ECONÔMICO E SUAS CONSEQUÊNCIAS

Semana de 12 a 18 de maio de 2025

    

Rosângela Palhano Ramalho[1]

 

A cada quarenta dias, o Comitê de Política Monetária do Banco Central se reúne para decidir os rumos da taxa básica de juros. Apesar de existirem outras opções, este é o único instrumento de combate à inflação que o país executa. Em sua última reunião, o Copom elevou a taxa pela sexta vez consecutiva, que passou de 14,25% para 14,75%. Temos reforçado reiteradamente que, mesmo não havendo descontrole inflacionário, há fervorosa defesa de que o arrocho econômico é essencial. O embasamento teórico que justifica a medida consolidou-se como dogma, como tabu, como verdade inquestionável. A teoria que representa a elite econômica e financeira, impôs ao país o sistema de metas inflacionárias que limita o crescimento econômico a níveis muito baixos.

No dia 13 de maio de 2025, foi divulgada a ata da última reunião do Copom. O documento reúne todas as justificativas que embasaram o aumento recente dos juros. O cenário externo, diz o relatório, “mostra-se adverso e particularmente incerto” e “alimenta incertezas”, o que exige “cautela por parte de países emergentes em ambiente de maior tensão geopolítica”. E, para nossa infelicidade, alerta o Copom, “o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho ainda tem apresentado dinamismo”. Vejam só! O brasileiro, que nos últimos anos obteve ganhos de renda continua comprando, as empresas, para suprir a demanda, continuam investindo e o governo se atreve a governar, gastando. Como então frear uma inflação de demanda, único diagnóstico que explica a alta de preços? Ora, reduzindo a demanda, a partir do único remédio da prateleira: juros nela! Então, diz a autoridade monetária, “...o arrefecimento da demanda agregada é um elemento essencial do processo de reequilíbrio entre oferta e demanda da economia e convergência da inflação à meta.” O grupo de distintos senhores sentados à mesa do Copom não se importa com o custo social de suas decisões, afinal, eles estão ali para adequar a realidade aos pressupostos teóricos que compartilham.

Mas, por que no “essencial” “reequilíbrio entre oferta e demanda” não se preserva a demanda em troca do aumento da oferta? Não, caro leitor, isto não é possível. A teoria diz que já crescemos o máximo que poderíamos, ou melhor, já ultrapassamos o produto potencial, o limítrofe do crescimento econômico interno. Se crescermos mais que isso, só herdaremos inflação. E por que não estimulamos a oferta para conduzir o nível de preços para baixo? Ah!, diz a teoria, isto é impossível no curto prazo! Transpor esta barreira exigiria muito esforço da economia e as empresas precisariam de um grande horizonte de planejamento para os novos investimentos. Deixemos isso para o longo prazo. É preciso matar a economia agora.

Entretanto, contrariando todos os postulados teóricos, a economia brasileira segue crescendo, mesmo com os aumentos consecutivos dos juros, desde setembro de 2024. Isto tem contrariado o Copom que, ressabiado, observa em sua ata: “Alguns fatores elencados durante a reunião seguem dando confiança ao Comitê de que o processo de moderação de crescimento deve ocorrer, após vários anos de surpreendente dinamismo.” A economia brasileira não está se deixando matar. Dados recentes da Pesquisa Mensal de Serviços realizada pelo IBGE apontam crescimento do setor de serviços de 0,3% em março, comparado a fevereiro. E a Pesquisa Mensal do Comércio, também do IBGE, apurou alta de 0,8% no volume de vendas no varejo totalizando crescimento de 0,9%, no primeiro trimestre do ano.

Diante dos fatos, o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, se apressou em dizer que a Selic permanecerá elevada por “período bastante prolongado”. E ainda afagou os especuladores dizendo que eles não precisam “se emocionar” com os dados ainda virtuosos da atividade econômica, porque teremos “um longo período de aperto...” Independentemente de quem seja o mandatário do Banco Central, o restrito arcabouço teórico aplicado à realidade econômica, continuará a acorrentar-nos em um círculo vicioso de juros altos, inflação moderada, baixo crescimento e intensa especulação financeira. Neste cenário, todos devem cumprir o seu papel: as empresas têm que parar de investir, os trabalhadores não podem estar empregados, nem podem consumir e o governo não pode gastar. Afinal, o asfixiamento da economia é “necessário”. Durma-se com um barulho desse.


[1] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; rospalhano@yahoo.com.br, rosangelapalhano31@gmail.com). Colaboraram: Lara Souza, Paola Arruda, Victória Rodrigues, Guilherme Gomes, Júlia Bomfim, Julia Dayane Rodrigues, Maria Júlia Alencar.

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quinta-feira, 15 de maio de 2025

O BRASIL ESTÁ INDO BEM, MAS POR QUE NÃO ESTAMOS AINDA MELHOR?

Semana de 05 a 11 de maio de 2025

   

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Caro leitor, a análise desta semana traz uma reflexão mais profunda que nos ajuda a entender a qualidade do atual crescimento econômico brasileiro. Como tem sido (relativamente mal) noticiado, o Brasil apresentou significativa melhora nos indicadores econômicos. O emprego informal é o menor dos últimos cinco anos, o nível de subutilização da força de trabalho é a segunda menor desde 2012, as exportações estão batendo recorde, a indústria tem crescido de forma sustentada e disseminada, a desigualdade de renda caiu, o comércio com a China se ampliou. A situação do Brasil melhorou ao ponto de subirmos cinco posições no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), sendo puxado pelo aumento da renda.

Afinal, diante disso tudo, por que não estamos surfando na onda desse crescimento? A resposta tem a ver com a forma como a indústria se organiza atualmente.

No passado, a estrutura produtiva dos países industrializados tinha um enraizamento muito forte no próprio território ao qual pertencia. Na prática, grande parte dos fornecedores de insumos estavam próximos, frequentemente nos arredores das grandes fábricas. Estas, por sua vez, formavam o centro em torno do qual se constituíam os grandes polos produtores de bens de uma mesma família: automobilístico, têxtil, petroquímico, etc. Soma-se a isso um conjunto de serviços que se formavam para a manutenção dessas atividades: bancos, comércio, saúde, beleza, educação, transporte, etc.

Como resultado, quando determinados setores entravam em rota de crescimento, essa expansão se espalhava para outros setores nacionais e, com isso, toda a economia se aquecia. O auge do crescimento econômico sempre foi um momento de euforia, que, diante da bonança generalizada, preparava as condições para a chegada da superprodução.

Entretanto, para a maior parte dos países capitalistas, isto não é mais a regra. Dentre outros fatores, um dos motivos fundamentais está na forma como se produz e se distribui a riqueza hoje. Cada vez mais, liderada por grandes conglomerados, a produção da maior parte dos bens que consumimos percorre uma ampla gama de países antes de chegar às nossas mãos.

Comandadas pelas chamadas empresas transnacionais, o que temos hoje são cadeias produtivas fragmentadas e dispersas em diversos países. A concepção do produto ocorre em um local, a produção das partes em outro, a montagem em outro e, por fim, o consumo pode ocorrer em qualquer lugar do planeta.

A grande novidade disto é que essas transnacionais conseguem acessar os locais mais remotos da Terra, se aproveitando das vantagens que cada um pode proporcionar: é mão de obra barata num lugar, leis trabalhistas flexíveis em outro, falta de legislação ambiental em outro, domínio exclusivo de jazidas minerais em outro e assim por diante.

Como resultado, as empresas transnacionais têm acesso aos fornecedores mais baratos e, consequentemente, têm custos mais baixos que as concorrentes. Assim, do ponto de vista empresarial, o padrão da organização industrial dessas empresas tem o melhor dos mundos, pois garante a elas a maior rentabilidade possível. Porém, isto traz consequências macroeconômicas importantes.

Limitando-se ao tema proposto nesta curta análise, o principal problema está no que chamamos de vazamento dos efeitos multiplicadores da produção. Quando uma empresa amplia sua produção, ela compra mais máquinas, equipamentos, matérias-primas, insumos auxiliares, etc. de outras empresas. Estas, por sua vez, também precisam comprar mais meios de produção para atender àquela empresa inicial. Cria-se, assim, um “círculo virtuoso” de crescimento.

Sob os padrões tradicionais da industrialização, quando a maior parte deste efeito multiplicador era concentrado nos polos produtores dos bens, isto resultava num forte crescimento da economia local. Mas isto não é mais observado na atualidade. Por exemplo, em 2024, a indústria automobilística do estado de Pernambuco buscou partes dos seus veículos nos EUA, Alemanha, Japão, França, Suécia e México, trouxe pneus de Taiwan, motores da Itália, laminados da Coreia do Sul, partes elétricas e eletrônicas da China. Em outras palavras, no atual padrão de industrialização, baseado em cadeias produtivas globais, os estímulos ao crescimento de um país são canalizados para fora do seu território, atingindo outras economias.

Nesse contexto, indo além de uma análise superficial da qualidade da propaganda do governo, é preciso compreender que a qualidade do próprio crescimento econômico brasileiro mudou nas últimas décadas. O efeito multiplicador dos nossos investimentos passou a se dispersar internacionalmente e, por isso, não mais gerar a mesma bonança de outrora. Este, por exemplo, é um dos principais motivos para debatermos a importância da nossa “reindustrialização”. Ela é fundamental para que o crescimento volte a acontecer de forma abrangente e ampla, alcançando mais elos da cadeia produtiva nacional.


[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Antonio Queirós, Brenda Tiburtino, Camylla Costa, Guilherme de Paula, Icaro Moisés e Lara Souza.

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sábado, 10 de maio de 2025

MUITO DINHEIRO

Semana de 28 de abril a 04 de maio de 2025

   

Paola Teotônio Cavalcante de Arruda[i]

 

Já faz um tempo que falamos que a elevação dos juros no Brasil tem imposto um custo elevado ao setor produtivo. Esse impacto, todavia, não é isolado – ele se insere em um quadro mais amplo de fragilidade política e institucional. A alta da Selic, que atingiu 14,75%, vem sendo justificada como uma resposta “ao avanço inflacionário e à deterioração das expectativas”. Seus efeitos colaterais, no entanto, estão se acumulando e seu preço está cada vez mais alto: de um lado, as empresas enfrentam dificuldades crescentes para honrar dívidas e investir; de outro, o setor público vê suas despesas com juros se aproximarem da casa de R$ 1 trilhão anuais.

Do ponto de vista empresarial, os números são alarmantes. Estudo da Alvarez & Marsal, veiculado pelo Valor Econômico na última semana, mostra que as companhias brasileiras terão que desembolsar cerca de R$ 126 bilhões a mais em juros até 2030. Isso significa que uma parte importante do caixa, que poderia ser aplicada em expansão, modernização ou inovação, está sendo “desviada” para sustentar uma estrutura de endividamento cada vez mais pesada. Já em 2025, os gastos adicionais estimados com juros somam R$ 26 bilhões, comprometendo o fôlego de empresas de diversos setores, especialmente aquelas que atuam em indústrias intensivas em capital, como siderurgia, petroquímica e infraestrutura.

Do outro lado da mesma moeda está o setor público: o Brasil gastou, em 12 meses até fevereiro, mais de R$ 923 bilhões apenas com o serviço da dívida — valor que representa quase 8% do PIB e responde por praticamente todo o déficit nominal do país. A conta dos juros, portanto, asfixia tanto o Estado quanto o setor privado, formando uma armadilha econômica que limita o crescimento e agrava a desigualdade.

Há aqui um efeito circular perverso. A Selic alta eleva o custo da dívida pública, que, por sua vez, aumenta o déficit nominal. Esse déficit alimenta as “incertezas do mercado” quanto à “sustentabilidade fiscal do país”, pressionando novamente as taxas de juros longas e “exigindo” uma política monetária ainda mais restritiva para conter as expectativas inflacionárias. Assim, mesmo com sinais de arrefecimento na inflação e com um câmbio relativamente estável, o discurso econômico hegemônico insiste em manter o país preso a um ciclo de juros elevados, crescimento baixo e endividamento crescente, que só beneficia grandes rentistas.

O resultado nós já sabemos e sentimos, caro leitor. Uma economia paralisada entre dois mundos: o privado, endividado e sufocado por custos financeiros crescentes, e o público, comprometido com despesas fixas, as quais o impedem de direcionar recursos para outras áreas econômico-sociais. Nesse cenário, tanto as empresas quanto o governo gastam mais para simplesmente manter-se operando — sem espaço para investir, inovar ou expandir. A política monetária, que deveria ser uma âncora de estabilidade, transforma-se em um obstáculo para o crescimento. A industrialização se mostra cada vez mais distante.

Diante de tudo isso, é preciso reconhecer que a política monetária brasileira não opera num vácuo técnico neutro, mas dentro de um arranjo em que expectativas — muitas vezes moldadas por interesses financeiros — se impõem como verdades incontestáveis, condicionando decisões que impactam diretamente o setor produtivo e a vida das pessoas. A manutenção de juros altos, mesmo em contextos em que a inflação real não justifica tal rigidez, revela uma captura ideológica da política econômica por uma racionalidade de mercado que favorece os detentores de capital financeiro em detrimento do investimento produtivo e do crescimento sustentável.

Romper esse ciclo exige mais do que ajustes técnicos: exige coragem política para questionar a teoria econômica dominante, enfrentar os interesses cristalizados no sistema financeiro e construir uma nova lógica econômica que privilegie o desenvolvimento, a produção e o bem-estar social.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduada em Relações Internacionais (UFPB).(paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Bruno Lins, Ícaro Formiga, Lara Souza, Miguel Oliveira e Ryann Felix.

 

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domingo, 4 de maio de 2025

O TARIFAÇO ABALA A ECONOMIA MUNDIAL

Semana de 21 a 27 de abril de 2025

   

Nelson Rosas Ribeiro[i]

 

As guerras da Ucrânia e de Gaza estão saindo das manchetes. Parece que o mundo já se acostumou com a matança e a destruição. Tudo se reduz a números. São “x” mortos, “n” drones e mísseis explodidos, “m” edifícios demolidos. Tudo normal. Não causa nenhum espanto ou revolta. Na falta de melhor assunto, Trump passou a ocupar os espaços na mídia. E não é sem razão. O irresponsável diabo ruivo continua com suas aventuras tresloucadas. Primeiro age e depois verifica quais são as consequências. O tarifaço está conseguindo alterar toda a economia mundial. A incerteza instalada é a principal causa da paralisação dos negócios. Tornou-se impossível saber como ficará o comércio, a demanda, os custos de produção, os preços, a produção, o que acarreta a suspensão de qualquer investimento. O mundo fica à espera da próxima canetada trumpista. Nada é previsível.

Para a nossa felicidade, a onda ainda não chegou à nossa economia, mas já provoca grande nervosismo e serve de pretexto para as aves agourentas iniciarem seu berreiro, e ressuscitarem suas propostas reacionárias de reformas contra os pobres. O FMI, em seu relatório World Economic Outlook (WEO), estima que crescimento do PIB no Brasil vai desacelerar para 2%, neste ano, a mesma taxa prevista para a América Latina e Caribe. O IGE, no seu Boletim Macro, estima um crescimento de 1,9%. A CNI reduziu suas estimativas de 2,4% para 2,3%. Como se não bastassem as dificuldades externas, a Confederação prevê, que o Banco Central (BC) elevará a Selic, atualmente em 14,25%, para 14,75%, até o final do ano. O crescimento real das concessões de crédito, que no ano passado foi de 10,6%, cairá para 6,5%. O mercado de trabalho terá uma expansão menor, e os investimentos, que no ano passado cresceram 7,3%, crescerão apenas 2,8%. O crescimento do PIB, já vinha desacelerando desde o 4º trimestre de 2024, com um crescimento de 0,2%. O menor crescimento da demanda e o aumento das importações, graças ao tarifaço de Trump, prejudicarão a produção da indústria nacional.

Uma notícia melhorou o humor geral e trouxe algumas esperanças ao mercado. Nas reuniões de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (BM), e em reuniões fechadas em Washington, os discursos de diretores do BC causaram a impressão de que há uma tendência para encerrar o ciclo de aperto monetário, ou seja, as decisões tenderiam a ser mais “dovish” (suaves), se bem que, diante das incertezas, os movimentos não podem ser bruscos. Apesar dessas esperanças, as expectativas gerais não são boas e as consequências do tarifaço são aguardadas. No entanto o ministro Haddad está otimista e afirmou que não há risco de recessão no Brasil.

Nos EUA, os custos da guerra comercial do Trump começam a ser sentidos, no aumento das despesas, nas interrupções das cadeias de suprimentos de matérias primas e componentes. Os CEOs de várias empresas já começaram a calcular os prejuízos e pressionar o governo. E são empresas de vários setores. No comércio Walmart e Target tiveram reuniões na Casa Branca. Há protestos da Boeing, que perdeu a venda de aviões para a China, da NextEra Energy, da fabricante de turbinas a gás GE Vernova, das empresas de serviços petrolíferos Halliburton e Baker Hughes, das operadoras de telecomunicações AT&T e Verizon, das farmacêuticas Boston Scientific e Johnson & Johnson, da construtora PulteGroup, da aeroespacial e de defesa RTX e GE Aerospace, para citar algumas. 

Voltando ao Brasil e ao ambiente político, as tensões têm aumentado, em torno do projeto da anistia aos golpistas. O PL, partido do Bolsonaro, faz todo tipo de chantagem para que o projeto seja posto em votação no plenário da Câmara, ameaçando iniciar um processo de obstrução nas reuniões do parlamento e impedir a aprovação de qualquer projeto. Um deputado do PL chegou mesmo a afirmar em discurso que, usaria a liberação das emendas de bancada, apenas para os parlamentares que votassem favoravelmente à anistia, ou seja, montou um balcão público de compra descarada de votos. O desespero aumenta na tentativa de salvar o Bolsonaro das condenações, e anular as decisões judiciais que o impedem de participar das próximas eleições. 


[i] Economista, Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Antonio Queirós, Jessica Brito, Julia Dayane, Maria Julia Alencar e Paola Arruda.

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sábado, 26 de abril de 2025

O MUNDO SEGUE EM TRANSE... ECONOMIA BRASILEIRA RESISTE

Semana de 14 a 20 de abril de 2025

   

Rosângela Palhano Ramalho[1]

 

Estimado leitor, o mundo virou o parque de diversões de Donald Trump. Com uma perspectiva megalômana de si mesmo, o presidente americano tenta ditar os rumos da geopolítica mundial, interferindo em conflitos internos e atacando a soberania dos países. Ao impor aos outros sua visão errática de como a economia funciona, Trump reverbera as lunáticas teorias conspiratórias propagadas pela extrema-direita mundial, ao mesmo tempo em que põe em risco o país que diz proteger. Enquanto faz isso, ele sadicamente se diverte. O setor financeiro mundial entra em pânico a cada declaração e o salve-se quem puder virou uma questão de ordem. À medida que os países atingidos pelo tarifaço reagem ou ainda estudam suas reações, as instituições econômicas internacionais, a exemplo do Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, seguem revisando para baixo as estimativas de crescimento da economia mundial para este ano. E a Organização Mundial do Comércio (OMC), apequenada, informou esta semana que o crescimento previsto para o comércio mundial de 2% em 2025 se transformará em retração de 0,2%.

Por sua vez, o Brasil enfrenta, além das ameaças tresloucadas de Trump, alguns desafios domésticos. O governo tenta lidar com a ameaça golpista que o cerca desde a eleição. Esta semana, o deputado líder do Projeto de Lei que visa anistiar os participantes da tentativa de golpe ocorrida em 08 de janeiro de 2023, conseguiu as assinaturas necessárias e protocolou um requerimento de urgência para sua tramitação. Resta agora que o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, paute o projeto. Além de ser uma aberração jurídica (o texto se aprovado, perdoa não só os golpistas que depredaram as sedes do Três Poderes, mas todos aqueles que planejaram e atentaram contra a democracia brasileira, mesmo que ainda não tenham sido julgados), o projeto é claramente inconstitucional, pois viola a separação e a independência entre os Poderes dando o aval para que o Congresso Nacional interfira em atos de competência do Judiciário.

Pesquisa realizada no início deste mês pelo DataFolha, indicou que 56% da população brasileira é contra a anistia. Mesmo assim, o pedido de urgência para tramitação do projeto recebeu 262 assinaturas, cinco a mais que o mínimo necessário. A base aliada do governo, que os golpistas pretendiam derrubar, contribuiu com 146 assinaturas. Ou seja, o golpismo está enraizado na estrutura do Executivo e o governo federal tem que enfrentar este fato.

Enquanto os reacionários agem, o governo administra o país, utilizando instrumentos que buscam promover uma maior justiça social. Não é à toa que os gastos com assistência social representam, atualmente, o segundo maior gasto federal. E não é à toa que esta rubrica, em especial os gastos com o Bolsa Família e com o Benefício de Prestação Continuada (BPC), sejam os mais atacados pelas elites econômicas. O desprezo aos pobres, que foram reinseridos no orçamento público, vem disfarçado de “cuidado” com as finanças do país. Felizmente, o “caos iminente” não chegou e certamente não chegará.

A economia brasileira resiste. Já chamamos a atenção para o bom resultado do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) do Banco Central do Brasil, que subiu 0,89% em janeiro na comparação com dezembro puxado pela atividade agrícola. Esta semana foi divulgado o Monitor do PIB, calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, que permaneceu estável em fevereiro, na comparação com janeiro. Mesmo estável, é importante destacar que o indicador registrou alta de 0,2% na atividade industrial com crescimento de 2% na Formação Bruta de Capital Fixo do país, o que demonstra que a atividade produtiva ainda tem fôlego e espaço para crescer. Enfim, os fatos aqui levantados indicam que o país segue resistindo ao tarifaço americano, aos efeitos dos aumentos consecutivos dos juros, às críticas na forma como se gere o orçamento e que, sem dúvida, resistirá aos anseios golpistas da horda de reacionários que habita o Congresso Nacional.


[1] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; rospalhano@yahoo.com.br, rosangelapalhano31@gmail.com). Colaboraram: Bruno Lins, Victória Rodrigues, Nelson Rosas, Ícaro Moisés, Lara Souza e Camylla Martins.

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quinta-feira, 17 de abril de 2025

EITA CANETADA MAL DADA...

Semana de 07 a 13 de abril de 2025

   

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Prezado leitor, certamente gostaríamos de iniciar esta análise falando dos feitos brasileiros nos últimos tempos.

Por exemplo, segundo a PNAD contínua, o desemprego no Brasil chegou a 6,8%. Já a renda dos 50% mais pobres da população teve um aumento de 10,7% entre os meses de outubro e dezembro de 2024, quando comparado com o mesmo período de 2023. Dentre os fatores que mais contribuíram para a melhoria de renda dos mais pobres, destacam-se o baixo desemprego e o aumento nos anos de escolaridade dos empregados. Outro indicador importante foi o crescimento do setor de serviços no Brasil, que, enfim, voltou a apresentar um crescimento disseminado. Em fevereiro de 2025, a atividade foi 4,2% maior do que a observada no mesmo mês de 2024.

Estávamos muito interessados em falar de outras coisas daqui, mas um ser humano alaranjado e de ralos cabelos dourados nos obriga a falar sobre seu tarifaço...

Como era de se esperar, as incompreensíveis medidas de Donald Trump afetaram primeiro as bolsas de valores. Causada por aquele famigerado anúncio das tarifas, ainda no dia 02 de abril, a semana passada começou com uma queda generalizada nas principais casas de apostas do mundo: Nasdaq, Dow Jones, Nikkei, Shanghai e Ibovespa. Nada mais normal, os especuladores aproveitando para fazer o que sabem de melhor: ganhar dinheiro em cima do desespero dos outros. Porém, passado o trauma inicial, a semana se encerrou com os índices em trajetória ascendente e apontando para a volta à normalidade.

O motivo para o fim do desespero especulativo foi o recuo dos EUA diante da escalada tarifária de todos os seus parceiros comerciais. Como era de se esperar, não ficaria pedra sobre pedra se a Lei de Talião continuasse em vigor (“olho por olho, dente por dente”). Apontado como principal alvo (ou mesmo o único, desde o começo), os norte-americanos só dobraram a aposta para cima da China. Mas, mesmo neste caso, o recuo não deve demorar.

O motivo principal, como já vimos falando em outras ocasiões (link), é que as cadeias produtivas das grandes empresas dos EUA estão espalhadas pelo mundo. Ou seja, para que as próprias companhias norte-americanas vendam dentro do seu território pátrio, é preciso trazer partes dos produtos (ou ele todo) de outros países via importações. Assim, com o aumento das tarifas, há, também: o aumento dos preços, o que pressiona a inflação, que pressiona os salários, que pressiona o lucro... As tarifas desmantelam a produção fora dos EUA, mas alteram profundamente o consumo, a produção e a renda dentro do próprio país. Com isto, ao invés de trazer as empresas e os empregos industriais de volta para dentro de suas fronteiras, o presidente americano vai trazer é mais problemas.

Enfim, por mais que o objetivo de Trump seja alterar a atual estrutura produtiva mundial, baseada nas cadeias globais de valor (CGV), não é assim que as grandes transformações ocorrem. Marx já dizia que, antes da decadência do velho, o novo já deve ter surgido e se mostrado melhor. Por exemplo, em meados dos anos 1970 e 1980, as CGV surgiram dentro de um padrão de organização industrial bem estabelecido e baseado na lógica fordista de produção em massa, sob a liderança dos grandes distritos industriais.



[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e Coordenador do PROGEB. (@progebufpbwww.progeb.blogspot.com@almeidalmilanezlucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Brenda Tiburtino, Ryann Félix, Ícaro Formiga, Maria Júlia Gomes, Raquel Lima e Antonio Queirós.

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domingo, 13 de abril de 2025

GOLPE COM SORVETE E PIPOCA? SÓ SE FOR NO CINEMA

Semana de 31 de março a 06 de abril de 2025

   

Paola Teotônio Cavalcante de Arruda[i]

 

No último domingo (7), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou ao centro do debate político e das redes sociais ao discursar na Avenida Paulista, em São Paulo, durante um ato em defesa do projeto de lei que busca “anistiar” os condenados pelos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023. A fala de Bolsonaro, feita em parte em um inglês vacilante — “Popcorn and ice cream sellers sentenced for coup d’État in Brazil” — viralizou justamente por sua pronúncia e pela tentativa de reduzir os atos de violência à atuação de personagens inofensivos. A frase, que em português significa “vendedores de pipoca e sorvete condenados por tentativa de golpe de Estado no Brasil”, foi recebida com escárnio por muitos e indignação por outros, pois escancara o esforço de minimizar a gravidade dos ataques à democracia brasileira.

Mas vale a pena refletir: manifestantes pacíficos, senhorinhas com Bíblia na mão e vendedores de pipoca foram responsáveis pelo 8 de janeiro? Antes de qualquer resposta, convém lembrar o que, de fato, aconteceu naquele dia. Os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 marcaram um dos episódios mais graves da democracia brasileira nas últimas décadas. Milhares de pessoas, desrespeitando o resultado das eleições presidenciais de 2022, invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes: Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal (STF) e Palácio do Planalto. Os prejuízos somaram cerca de R$ 24 milhões aos cofres públicos, com a destruição de obras de arte, móveis históricos e objetos raros, além de causar um profundo abalo na estabilidade institucional do país. O vandalismo e a violência não foram atos de espontaneidade pacífica, mas sim de uma tentativa organizada de subverter a ordem democrática: é o que se tem provado a partir das investigações.

Apesar do inglês cômico e da retórica que tenta pintar uma narrativa de perseguição política contra "cidadãos de bem", Bolsonaro ignora (ou finge ignorar) a realidade dos fatos. Um exemplo é Wesley da Silva Ferreira Taveira. Preso pelos atos golpistas de janeiro, ele perdeu o direito de responder em liberdade após se envolver em um atentado contra uma empresa de internet no Pará, a mando da facção criminosa Comando Vermelho. Em dezembro de 2024, foi condenado a 26 anos e 8 meses de prisão por integrar essa organização criminosa e cometer incêndio em seu favor. Apesar disso, Wesley tenta emplacar a versão de que foi a Brasília, exatamente no dia 8 de janeiro, para comemorar o aniversário de uma amiga de infância, e que estava simplesmente “na hora errada, no lugar errado”, quando tudo aconteceu. Assim como todos os outros condenados, Wesley vende a narrativa de ser vítima de perseguição política, tentando apagar o rastro de crimes concretos, com um discurso forçado de inocência. 

Nesse contexto, seria possível desestimular o extremismo político que floresce nesse ambiente de desinformação e impunidade? O cientista político Christian Lynch defende que sim, desde que haja ação coordenada em quatro frentes. Primeiro, com a punição exemplar dos responsáveis por instigar e liderar as ações golpistas, como o próprio Bolsonaro, para evitar que o exemplo se repita. Em segundo lugar, com a regulamentação de redes sociais e inteligência artificial, combatendo o anonimato e responsabilizando plataformas e usuários por conteúdos nocivos à democracia. Terceiro, retomando pautas de unidade nacional, hoje capturadas pela extrema direita, para reconstruir uma agenda que una o país sem abrir mão da justiça social e dos direitos das minorias. E por fim, promovendo uma profunda modernização do Estado brasileiro, cuja estrutura ainda responde de forma lenta e ineficaz às demandas da era digital — um Estado obsoleto frente à realidade do século XXI.

Minimizar os crimes de 8 de janeiro com piadas em inglês ruim não apenas desrespeita a História e as instituições brasileiras, como também tenta blindar responsáveis por crimes graves com o verniz da perseguição política. O desafio que se impõe é claro: proteger a democracia exige coragem para punir, sabedoria para reformar e responsabilidade para unir o país em torno de valores republicanos — e não da distorção populista de quem tenta apagar seus próprios rastros.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduada em Relações Internacionais (UFPB)(paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Júlia Bonfim, Lara Souza, Mateus Eufrasio, Gustavo Figueiredo e Júlia Dayane.

 



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segunda-feira, 7 de abril de 2025

TRUMP, AS TARIFAS E AS GUERRAS

Semana de 24 a 30 de março de 2025

   

Nelson Rosas Ribeiro[i]

 

Está se tornando enfadonho falar sobre conjuntura. Não conseguimos fugir de dois assuntos que continuam perturbando a humanidade: as guerras da Ucrânia e de Israel. Todos os dias ouvimos a contagem dos mortos e a descrição das novas áreas destruídas. Na Ucrânia não se fala na participação da OTAN e dos países europeus e Estados Unidos, sem os quais a guerra já estaria encerrada. É muito cômodo para os sanguinários generais, poder travar uma guerra onde os outros morrem. E quem paga o preço desta desventura é o povo ucraniano ou o que resta dele.

Com a chegada de Trump ao poder, os europeus tiveram de meter a mão nos bolsos e estão sendo obrigados a financiar as despesas militares. Grande problema, pois, dão conta de que não têm condições nem financeiras, nem técnicas para aguentar o tranco. Serão obrigados a apertar o cinto de seus próprios povos que, certamente, não vão gostar. E esperamos que não tenham a tresloucada ideia de enviar tropas para a zona do conflito. De qualquer forma, desta área só poderemos esperar o agravamento da crise que passará para o campo da Economia.

A outra guerra, a de Israel, é ainda mais trágica. Não é propriamente uma guerra, é um massacre, um genocídio. E com Trump, a situação tornou-se ainda mais grave. O poder da colônia judaica no interior dos EUA mostra-se com toda clareza. Corre-se o perigo do extermínio de um povo, o povo palestino, o que aliás é um projeto de Israel já há muito tempo. Israel usa sofisticadas armas, fornecidas pelos americanos, para bombardear as ruínas. Torna-se mesmo difícil saber onde se escondem as pessoas, pois o que as reportagens mostram são só ruínas. Só vemos que ainda existem pessoas quando aparecem as cenas dos deslocamentos, ordenados pelas tropas de Israel, que empurram as populações de um lado para outro. Acho que querem saber se ainda há alguém vivo para lançar mais bombas. E, por incrível que pareça, enquanto sonha em limpar Gaza, eliminando as ruínas e o povo, para construir seu resort, começa a preparar a nova ofensiva contra o Irã. A desunião dos países árabes permite que esta atrocidade esteja sendo cometida, enquanto o resto do mundo assiste de braços cruzados. Afinal, são só algumas organizações terroristas, que precisam ser eliminadas.

Ao falar das guerras, tivemos de falar do Trump. Ele está tendo uma grande influência no prosseguimento delas. Mas o Trump tem seu brilho próprio. Sua política do MAGA tem consequências econômicas ainda mais importantes. Boa parte das tarifas começou a ser praticada agora, com maior intensidade. Os efeitos já estão sendo sentidos, e as retaliações estão sendo deflagradas. Só para citar uma delas, a retaliação do Canadá está tornando inviável o estado americano do Alaska, que está situado a milhares de quilômetros de distância do resto do país. A única ligação possível por terra é através de uma estrada, que corta o Canadá. As províncias atravessadas começaram a cobrar pedágio, encarecendo os fretes e provocando a elevação dos preços dos produtos transportados.

No Brasil, ainda não começamos a sentir os efeitos das tarifas Trump. O governo tem sido muito cauteloso no tratamento do assunto dos 10% sobre os produtos. Continuamos a defender a negociação, o que parece muito sensato. No entanto, se nada for conseguido, devemos nos preparar para as consequências na inflação e aí teremos a gangue do Banco Central (BC) em ação. Certamente, responderemos elevando os juros. O povo, os empresários, o desenvolvimento, continuarão pagando o preço da estúpida política monetária.

Falando em BC, lembramos que na última reunião do Copom, a Selic foi elevada para 14,25%, aumentando 1 ponto percentual, como havia sido prometido pela antiga direção. Além disso, o novo presidente, Galípolo, declarou que o ciclo de alta ainda não terminou, apenas prometendo que seria inferior a 1%. O “mercado” aposta que a elevação será de 0,5%. E assim seguimos nós atropelando as dificuldades.


[i] Economista, Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Antonio Queirós, Bruno Lins, Jessica Brito, Miguel Oliveira, Raquel Lima e Paola Arruda.

 

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quinta-feira, 27 de março de 2025

QUE PENA, O IBC-BR CRESCEU... QUE BOM, OS JUROS AUMENTARAM DE NOVO!

Semana de 17 a 23 de março de 2025

  

Rosângela Palhano Ramalho[1]

 

Prezado leitor, nosso título contém ironia, mas resume bem o sentimento exposto nas colunas de análise econômica com a divulgação do mais recente dado conjuntural interno. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) subiu 0,89% em janeiro na comparação com dezembro, alta que foi estimulada pelos bons resultados da produção agrícola. Para surpresa de ninguém, o mercado cometeu o primeiro erro do ano. O resultado esperado pelos representantes do setor financeiro ouvidos pelo Jornal Valor Econômico era de alta do IBC-BR de apenas 0,25%. O número decepcionou os defensores da política monetária contracionista, que não cansam de ver seus pressupostos teóricos se diluírem na realidade. Mas eles não se deixam abater. Afinal, suas previsões (em 2024, 95% das vezes, erradas), certamente se concretizarão ao longo do ano. A “atividade doméstica deve desacelerar ao longo do ano”, já que haverá “menor expansão da renda disponível às famílias”, “condições financeiras mais apertadas” e “menor impulso fiscal". Afinal, o remédio amargo foi prescrito e em “algum momento” fará efeito.

Divulgado dois dias antes da decisão do Copom sobre os juros, o excelente resultado do IBC-Br trouxe preocupações porque não puniu devidamente o consumidor que insiste em gastar sua renda, nem desestimulou o produtor agrícola que teimou em produzir e sequer intimidou o próprio governo que persiste em executar o orçamento, gastando os recursos públicos. Felizmente, dizem os analistas econômicos e os especialistas do mercado, o Copom tinha contratado mais um aumento na taxa de juros. O mantra da semana então foi eleito: o Banco Central precisa olhar o IBC-Br de janeiro com certa cautela para não abandonar a política de juros altos cedo demais, já que o purgante parece não ter deixado a economia em estado terminal.

O Copom se reuniu e, como esperado, de forma unânime, elevou a taxa de juros de 13,25% para 14,25%. O ciclo de aperto monetário com altas consecutivas de 1% nos juros, indicadas de forma antecipada, encerrou-se nesta reunião. A nota que embasa a decisão do Colegiado justifica o aumento: “O cenário mais recente é marcado por desancoragem adicional das expectativas de inflação, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho, o que exige uma política monetária mais contracionista.” Sem detectar riscos de aceleração inflacionária, chamam atenção os termos “resiliência” e “pressões” usados pelo Copom para explicar porque devemos concordar com uma política monetária restritiva. Primeiro, tentam nos convencer de que a morte é iminente, depois, que o paciente vai morrer caso a prescrição não seja aplicada, e uma vez prescrita, dizem, a medicação vai evitar a morte, mas o paciente precisa ficar em coma por algum tempo. Não são boas escolhas! Em especial, porque elas punem os mais vulneráveis! E destroem a economia nacional.

O Copom também informou, no seu comunicado, que o cenário externo continua “desafiador”, em virtude da conjuntura e da política econômica americana, bem como das incertezas que cercam a sua política comercial. O fato é que as atitudes tresloucadas de Trump já estão produzindo resultados. Os mais recentes dados da economia americana mostram que os consumidores estão diminuindo seus gastos. De acordo com a consultoria RetailNext, o fluxo de clientes nas varejistas americanas caiu 4,3% em março comparado ao mesmo mês do ano passado. A Placer.ai também registrou menos visitas às varejistas como Walmart, Target e Best Buy nas últimas semanas. Por sua vez, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) revisou, para baixo, as expectativas de crescimento do mundo. O mundo crescerá, em 2025, segundo o órgão, 3,1% ao invés dos 3,2% previstos antes. Os Estados Unidos tiveram sua projeção revisada de 2,4% para 2,2% e a previsão brasileira caiu de 2,3% para 2,1%. 

Ao que parece, o desaquecimento econômico americano e mundial contribuirá para que o coma econômico induzido, tão cortejado por nossa autoridade monetária, aconteça. Se isto se concretizar, a “sorte” de crescer internamente cessará, os bons resultados conjunturais não precisarão ser lamentados e poder-se-á comemorar à vontade os aumentos da taxa de juros.


[1] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; rospalhano@yahoo.com.br, rosangelapalhano31@gmail.com). Colaboraram: Rubens Gabriel, Victória Rodrigues, Nelson Rosas, Maria Júlia Alencar, Júlia Bonfim e Gustavo Figueiredo.

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